Deiber Nunes Martins
O lançamento nos cinemas do
aguardado “Jogos Vorazes: A Esperança – Parte Um” fez a Agência Nacional de
Cinema – Ancine, abrir um importante debate sobre a concentração dos filmes de
grande apelo popular, os chamados “Blockbusters” nas salas, prática cada vez
mais comum, realizada pelas grandes distribuidoras de filmes. No Brasil, o
filme em questão ocupará cerca de 46% das salas de cinema.
Definida como prática predatória pela
Ancine, a concentração de um lançamento do cinema num determinado contingente
de salas de exibição impede a divulgação e comercialização de outros títulos,
limitando o ingresso das pequenas produções, além de esvaziar o interesse do
público pelo que está sendo exibido.
Por outro lado, limitar a
quantidade de salas de exibição que um filme pode ocupar é restringir a
estratégia de distribuição da indústria do cinema, interferindo diretamente na
livre regulação da indústria cultural. Cercear a disseminação de uma produção
artística é um duro golpe a democracia do país.
Na França, há uma limitação de
salas de exibição para os grandes lançamentos do cinema da ordem de 30%. Se
esta mesma legislação vigorasse no Brasil, o filme Jogos Vorazes não seria exibido
em 455 das 1310 salas onde está sendo lançado. Se por um lado esta redução do
número de salas de exibição, possibilitaria a disseminação de outros títulos
com distribuição e estreias mais modestas, por outro, representaria uma censura
velada ao filme em 455 salas do país.
Antidemocrática ou não, a
limitação das salas de cinema aos títulos blockbusters representaria um avanço
da indústria do cinema local, que em geral conta com parcos investimentos em
suas produções e a grande maioria deles vêm de empresas públicas e grupos
locais. É um fomento à atividade cultural no Brasil. Se por um lado, limita a
penetração de um título de grande apelo popular, por outro, abre espaço a novas
possibilidades da indústria cinematográfica.
A concentração das salas de
exibição de cinema do país em um único título é nociva a diversidade de
produções, muitas delas marginalizadas por serem lançadas em conjunto com
filmes já consagrados, seja pela produção envolvida, seja pelo trabalho
mercadológico feito pelas grandes distribuidoras. Em nada parece ter aqui uma
limitação do alcance da democracia. É preciso observar que ampliar a oferta de
títulos nas salas de cinema é abrir espaço para diferentes percepções e
preferências e, portanto caminhar rumo a democratização deste espaço cultural. Ao
contrário, se um filme, ocupa a metade das salas de cinema do país, o que se vê
é a perda do interesse do público por uma diversão cada vez mais padronizada e “enlatada”.
Não se avalia aqui a qualidade das produções, mas sim a diversidade do gosto
nacional.
Portanto, a discussão aberta pela
Ancine é de profunda importância para a indústria do cinema. Até que ponto uma
produção, detentora de todo arcabouço de distribuição nacional e internacional
pode penetrar de forma predatória nas salas de cinema por todo o país? Nada contra
o filme Jogos Vorazes ou produção milionária que o cerca. Mas é preciso
compreender que o cinema é uma atividade cujo esforço intelectual deve ser
preservado, em detrimento do poder econômico que o cerca.
Desta forma, toda prática
predatória contra a sétima arte deve ser barrada, independentemente do quão
arbitrário isso possa parecer. A intervenção do governo, por meio da Ancine ou
de qualquer outra instituição na indústria cinematográfica deve ter como
objetivo ampliar os horizontes culturais do povo brasileiro, permitindo que
produções mais simples, sem o aporte das grandes distribuidoras também
encontrem espaço junto ao público.
Belo Horizonte, 19 de Novembro de
2014
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