segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

As Dores do Caminho

Por Deiber Nunes Martins

Um grande desafio à nossa humanidade é lidar com o sofrimento. Quando a dor bate à nossa porta é o momento onde enfrentamos diretamente nossos medos e nossas imperfeições. É grande a tentação dos que querem justificar a grosseria, a falta de caridade, na dor que está sentindo. E muito maior ainda a tentação dos que querem culpar alguém ou a si mesmo pela dor. Começo agora a falar sobre o tema, e espero concluí-lo em oportunidade fortuita.

Há cerca de um mês, venho sentindo dores de cabeça, dores na nuca e dores inexplicáveis pelo corpo. No começo relutamos em procurar ajuda, eu pelo menos sou assim. Prefiro agüentar a dor a ouvir palpites errados que podem me levar a preocupações exageradas. Pode ser complicado partilhar a dor mesmo com quem está próximo a você, pois numa ocasião de zelo, talvez esta ou estas pessoas podem até prejudicar, ao invés de ajudar. É comum os flagelos da auto-medicação e das loucuras a que o sofredor é submetido. Muitas vezes para agradar. Por isso tudo, sou relutante em buscar ajuda de imediato. E também conhecendo a saúde no Brasil, prefiro consultar com um médico quando o bicho de fato está pegando porque se não eles inventam uma porção de coisas, uma porção de exames e aí, sabe-se lá que conclusões chegarão e quão precipitadas podem ser.

Mas estas dores não me deixaram em paz e então visitei um médico perto de casa, que sem muito me examinar concluiu resoluto: virose. Receitou analgésicos e me garantiu em três dias estar curado. Passaram-se os três dias. Passaram-se quase quinze e resolvi procurar outro médico. Este outro médico mais detalhista, me examinou e me fez um caminhão de perguntas, algumas que tive até dificuldade de responder, por não conseguir puxar da memória. Ao final da consulta, receitou-me um medicamento que até fez efeito por alguns dias, mas eis que a dor está de volta. E às vezes até mais forte.

Sabe quando você não sabe o que fazer? Pois é, é como me sinto, diante dessa dor. E quando não sabemos o que fazer, acabamos por pedir ajuda a quem está próximo. Primeiro, as pessoas da família. A recomendação é unânime: procurar outro médico, que o problema é sério. Problema sério. Problema quando vem sozinho já é problema. Imagina quando vem acompanhado do “sério”! Se você não tem estrutura, desespera. Eu, com isso, consigo muitas vezes me colocar no lugar das pessoas. Muitos de nós nos culpamos por tudo, somos inseguros, imaturos, com mania de perseguição. Se alguém se volta para uma pessoa deste tipo e diz que o problema é sério, aí é que será mesmo. Pois a pessoa terá um troço. Recuperando do baque do “problema sério”, vamos aos amigos. E quando se recorre aos amigos, o mínimo que se espera é um vago desejo de melhoras. Talvez, com alguma sorte, um carinho, um afago e com mais sorte ainda a resolução do “problema sério”. Mas, dos amigos verdadeiros, basta que estejam com a gente, sofrendo junto, mesmo sem sentir, apenas pra dar o “apoio moral”.

Ledo engano. Pelo menos pra mim. Ao longo dos dias, o que mais escutei dos amigos, foi para tomar cuidado que pode ser sério. Que DEVE ser sério. Afinal, com dor de cabeça não se brinca. Eu não brinco com dor nenhuma! E ao final de cada conversa, porque será que a minha cabeça dói ainda mais?

Um(a) amigo(a) de verdade, precisa entender que não precisa entender do problema do amigo, para ajudá-lo. E que muitas vezes, o amigo só partilha o sofrimento, porque está se sentindo sozinho diante dele. Então é preciso perceber, o sofrimento bateu à porta do meu amigo. Eu não posso pedir pro sofrimento sair da casa dele e ir se alojar na minha casa, mas eu posso ir à casa do meu amigo, ficar lá em silêncio, com ele. Às vezes a companhia silenciosa vale mais que a companhia falastrona. E quando se lida com a internet, há ainda mais um detalhe: a web não mede o silêncio corretamente. Nela, o silêncio é como fleuma, ninguém está se importando, todos se calam. Então os amigos precisam se dizer, mas se dizer com amor. Pra não assustar ainda mais quem sofre. Se eu não posso dar carinho, conforto e consolo a meu irmão que sofre, que pelo menos eu respeite a sua dor e trabalhe em mim, uma maneira de quebrar o meu egoísmo. E é tão difícil!

Muitas vezes chegamos perto de quem tem sofrimento maior que o nosso e derramamos todas as nossas dores, como se fosse ele/ela, um coletor de lixo, à espera dos nossos lixos. Lidamos com o problema como se ele fosse um lixo, um entulho. Mas o problema nada mais é que uma oportunidade de crescimento à nossa porta. Sofrer não vai te fazer bem, mas certamente, lhe fará ser melhor com você e com os outros.

Quando eu olho minha dor, eu preciso estar preparado pra saber que a dor do outro, ainda pode ser maior que a minha. Mas quando está doendo a gente murmura porque não quer estar sozinho diante da dor.

Então, diante desta dor persistente, meu Senhor, eu digo que estou aprendendo com ela. Aprendendo a entregar a Ti todo o meu fardo e não ao meu irmão, aos meus amigos. Eu preciso respeitá-los, pois não sei qual o momento em que vivem. Pai de amor e de bondade, eu te entrego nesta madrugada, a dor que sinto, toda dor que sinto. E vos louvo, pela dádiva de colher frutos também em minhas misérias. Eu não sei como será amanhã cedo, Senhor. Mas sei que contigo, certamente eu poderei caminhar com esta dor. Muito obrigado, meu Deus!

Belo Horizonte, 20 de dezembro de 2011