Por Deiber Nunes Martins
O velho drama da adoção volta à
tona com a decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais em devolver a guarda de
uma menina de 4 anos a seus pais biológicos. A criança, que foi encaminhada a
um abrigo de menores com dois meses de vida, vítima de maus tratos dos pais,
foi adotada na mesma época por uma família da região metropolitana de BH e
agora deve voltar para os pais biológicos, após solicitação dos mesmos. À época,
o conselho tutelar também retirou deles outros cinco filhos que já voltaram
para a casa. A alegação do pai biológico da menina é que hoje, melhor de vida e
livre do vício do alcoolismo, seria capaz de cuidar da mesma, junto de sua
esposa, que também fez tratamento contra a depressão. A lei neste caso, prevê a
guarda do filho a seus pais biológicos, mas será que este é o melhor caminho
numa situação como essa?
Após audiência de instrução, a
mãe adotiva da criança, num desabafo, disse ser “uma fria” adotar uma criança e
desaconselhou todos os casais que se interessam pela adoção. E de fato, a
medida legal desestimula a prática da adoção no Brasil. Imagine o drama de uma
criança e seus pais adotivos, após algum tempo, tendo que se separarem para que
esta volte ao convívio de seus pais originais? Pai e mãe são aqueles que criam,
já nos diz o senso comum. De forma que a identificação da criança com os pais
acontece pelo convívio e não pelos laços sanguíneos. Assim sendo, qual não é o
trauma da criança ao ser retirada do lar dos pais que ela conheceu e aprendeu a
amar, a colocar sua segurança e sua confiança? Sem dúvida alguma, uma situação
muito delicada, mas que aos olhos da lei, simplifica-se na letra fria da
legislação. O juiz precisa seguir o que está escrito e nada mais.
É aí que mora o
calcanhar-de-aquiles da justiça. O positivismo jurídico quebra toda coerência
ou bom senso da lei e faz com que a sociedade tome certos “sustos” com as
decisões judiciais. A qualquer cidadão de bem, a decisão sensata na questão não
seria outra se não a manutenção da guarda da menina com os pais adotivos. Ora,
os primeiros pais tiveram a oportunidade de construir um lar e falharam,
permitindo que a própria lei retirasse deles a guarda de seis filhos! Não é
possível que isso seja negligenciado. Mas é. Quando julga, o juiz, por alguma
força pessoal, conduta ou preceito, ele deixa de lado seu papel de cidadão, de
pai de família, sua crença e tudo o mais e se insere no contexto frio da lei. É
um mundo de códigos, artigos, incisos e parágrafos que definem a vida e a
morte, o bem e o mal. Quando sai de seu mundo real, o juiz não pode ser
condenado por tal. A propósito, em nossa sociedade civilizada, decisão judicial
não se discute, se cumpre. Por isso, não é caso de indignação, mérito ou
demérito pessoal e sim a execução sumária da lei em todas as suas letras.
Mas também é uma vida, uma
história, uma família. Talvez, seja possível perceber o despreparo dos pais
biológicos em criar esta menina, pelo fato de os próprios permitirem que ela
viva esta situação. O egoísmo de ambos, talvez possa corromper todo o emocional
desta criança que já identifica nos pais adotivos a sua família. A faixa etária
de 0 a 5 anos é decisiva para o ser humano, no que tange ao seu emocional. Isso
deve ser do conhecido de todo pai e de toda mãe, biológico ou adotivo, afinal são
os primeiros cinco anos de uma criança que definirão toda a sua história de
vida. Por isso, a própria pendência judicial já se faz um absurdo na vida e na
história desta menina.
A decisão do Tribunal de Justiça
de Minas Gerais representa um golpe na intenção de quem pensa em adotar uma
criança. Assim como o tráfico de órgãos desmotiva os pretensos doadores, a
devolução de uma criança adotiva a seu lar original desmotiva quem por ventura
esteja pensando em dar um lar às crianças abandonadas. E quem perde com isso
somos todos nós. Nem sempre a interpretação fria da lei garante a sociedade, o
seu melhor.
Belo Horizonte, 18 de outubro de
2013.
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